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Essa é a foto do lanche real a que me refiro no texto |
Quando me sentei
ao lado dele pensei que fosse mais um desses homens mais velhos que gostam de
mulheres mais novas, pois ele ficou me olhando muito. Mas com o tempo vi que
era mais um olhar de curiosidade do que de interesse como homem. Era um senhor
bem magro, com uns 80 anos ou mais.
Peguei meu livro e
me entretive. Ele balbuciou
poucas palavras, mas nem eu nem o outro passageiro ao lado dele demos atenção.
Então passou o resto da viagem olhando para o próprio colo. Às vezes arriscava
espiar meu livro. Um livro grande, de uma série de grande sucesso mundial,
cheia de belas fotos. Esqueci-me que estava num avião e mergulhei no mundo
medieval do livro, até que fui surpreendia pelo comissário anunciando o lanche
da noite.
Abri o meu e
devorava-o rapidamente
pensando em retomar minha leitura. Então percebi que um barulho repetitivo
acontecia ao meu lado. Era ele tentando abrir a embalagem do lanche. Demorou
tanto pra conseguir abrir que os comissários já voltavam para retirar o lixo.
Eu pensei em oferecer ajuda, mas fiquei com medo de envergonhá-lo. Esperei
mais um pouco, com um aperto de solidariedade de ver aquele senhor não
conseguindo abrir uma simples embalagem plástica. Pensei no quanto ele já devia
ter feito pelo mundo e agora não conseguia abrir seu próprio lanche. E que
seria dali para pior. Pobre senhor. Ainda olhando para o próprio colo enquanto
escrevia sobre ele. Rapidamente pensei o que estaria fazendo indo para
aquele destino. Teria alguém o esperando? Esposa? Filhos?
Netos? Teria ele ido visitar parentes em São Paulo e agora voltava para uma
vida solitária?
Voltando ao
episódio do lanche, ele comeu tão rápido que acabou antes de mim, e antes do
comissário chegar ao nosso assento. E para se livrar da embalagem, amassou tudo
junto com o copo de plástico, prendendo-os entre a mesinha e
o encosto da poltrona da frente. Como um triturador de
material de reciclagem, ele apertava a mesinha contra o banco, amassando ainda
mais o copo.
Estava eu
apreensiva com o momento em que ele ia empurrar a cabeça da minha colega que
sentava no banco na frente dele. Eu que pretendia ler meu livro até o final da
viagem, entreguei os pontos e me rendi ao sono. Não sem antes colocar meu
aparelho dentário móvel que me permite um sono mais confortável. Que
ironia do destino, pois ele
nem sequer tocou na sua dentadura, se é realmente que usava uma. E continuou contemplando seu colo o resto da
viagem.
Não sei o que
aconteceu com ele depois que desembarcamos. Eu estava ocupada demais esperando minhas bagagens e
conversando com meus colegas de equipe, pois era uma viagem de trabalho, e não
me lembrei mais daquele senhor que me pareceu tão solitário. Espero que estivesse
indo ao encontro de alguém que estivesse pensando e esperando por ele.
Também espero que ele tenha levado uma vida digna, para poder na sua velhice
ter alguém que o queira bem. Porque por mais que seja triste uma velhice
solitária, deve ser mais triste ainda passar uma vida inteira tomando atitudes que não farão
com que as pessoas se lembrem de você no final dela.
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